Menores LGBTQIAPN+ em grupos de excursão para Orlando

Há mais de 10 anos eu presenciei um caso grave de bullying num grupo em Orlando. Eram 4 menores desacompanhados dividindo o mesmo quarto no hotel e, infelizmente, um deles sofreu com abusos verbais e violência física. Na época acionamos pais, escola, separamos os menores, fizemos o que estava ao nosso alcance… mas descobrimos depois que o garoto já sofria na mão dos colegas bem antes, e seus pais não faziam ideia. Foi muito, muito triste.

Desde então, tenho trazido uma discussão para minhas aulas quando o assunto é a venda de grupos de excursão para menores desacompanhados: como evitar esse tipo de violência, especialmente entre menores?

Embora atualmente a gente tenha muito mais acesso a informação e as questões LGBTQIAPN+ sejam mais amplamente discutidas, ainda existe uma lacuna gigantesca no que diz respeito ao preparo de pacotes de viagem e dos profissionais envolvidos na operação dessas viagens, dos agentes que vendem aos guias que conduzem nos parques.

Pra ficar mais claro, vamos ao contexto…

Os quartos de hotéis nos EUA são configurados, na grande maioria das vezes, com 2 camas de casal de tamanho queen, como esses que mostro aqui, como o Disney’s Pop Century Resort e o Universal’s Endless Summer Dockside Inn & Suites, onde geralmente se hospedam os grupos de excursão em Orlando.

Esses hotéis não aceitam camas extras e nem permitem que mais de 4 pessoas ocupem os quartos, mas há casos em que o próprio hotel oferece suítes mais espaçosas para 6 ou 8 pessoas, que podem ser solicitadas como pedidos especiais (e cobradas de acordo) mediante a necessidade das famílias que estão comprando. Não é comum, mas pode acontecer.

Ao comprar um pacote de viagem para seus filhos, os pais podem optar por acomodações duplas, triplas ou quádruplas, e na grande maioria das vezes, a acomodação quádrupla é a escolhida por ter o preço mais baixo.

A quantidade de camas sempre será a mesma independente da escolha, o que muda é a distribuição dos ocupantes nas camas, ou seja… na opção dupla cada menor dorme na sua cama, na opção tripla uma das camas terá 2 ocupantes (e eles podem se revezar a cada noite para quem dormirá sozinho), e na opção quádrupla cada cama recebe 2 ocupantes. Por questões de segurança, nem todas as agências permitem a opção single, com apenas um menor ocupando o quarto sozinho.

As regras para a divisão dos quartos costumam ser:

  • Meninos apenas com meninos e meninas apenas com meninas
  • Somente se misturam meninos e meninas SE todos os pais estiverem de acordo e documentarem o pedido por escrito: nesse caso, os menores podem ser da mesma família ou apenas amigos… desde que todos os pais estejam de acordo, é OK misturar os meninos com as meninas.
  • Não se misturam maiores de 21 anos com menores, já que maiores de 21 podem consumir álcool e é proibido que se tenha menores no mesmo ambiente – exceto é claro se forem da mesma família, como pais e filhos, tios e sobrinhos, etc.
  • Por questões de operacionais e de segurança, não se acomodam passageiros nos mesmos quartos dos guias.

 

E o que acontece quando, por exemplo, um adolescente viaja sem os amigos, sem conhecer ninguém antes da excursão?

Nesse caso, existem os QUARTOS A COMPARTILHAR, que seguem as regras acima porém são preenchidos por desconhecidos que fecham o mesmo pacote. As agências costumam fazer a distribuição do passageiros nos quartos e, antes da viagem, colocam todos em contato para que se conheçam.

Temos o contexto, maravilha. Vamos então evoluir nas questões de segurança?

Situação 1: digamos que o menor viajante seja LGBTQIAPN+ e tenha uma relação legal com os pais e com suas preferências. No fechamento do pacote ele pode, se desejar, comunicar a agência e solicitar um quarto individual (se permitido), por exemplo. Mas e ele se só puder ou só quiser pagar pelo quarto duplo, triplo ou quádruplo? Ele precisa ter acesso a todos os tipos de acomodação normalmente, ou então estaria diante de um caso de preconceito… certo? Logo, sabemos que a agência não pode deixar de ofertar todos os tipos de quarto.

Se esse mesmo menor simplesmente não quiser comunicar suas preferências, o que ninguém é obrigado a fazer, a agência vai seguir o protocolo normal e acomodá-lo com outros menores do mesmo sexo, de acordo com sua escolha por duplo, triplo ou quádruplo. Logo, esse menor e seus pais precisam estar cientes de que, ao escolherem acomodações com mais de um ocupante, estão de acordo com as regras.

Se ele estiver viajando com amigos e amigas, basta que todos se organizem com a distribuição nos quartos, e aí fica fácil! Um cenário seguro e tranquilo para que todos sejam muito felizes e curtam muito a viagem.

Situação 2: digamos que o menor viajante seja LGBTQIAPN+, mas ao contrário da cenário acima, não tenha uma relação legal com os pais ou simplesmente ainda não esteja seguro para assumir suas preferências. Se ele não vier de uma família que o apoia e dá espaço para o diálogo, ele pode estar buscando este espaço (ou algum alívio) nessa viagem, e nessas horas o agente de viagens precisa ter a sensibilidade e cuidado de conduzir a venda de forma segura e sem exposição, assim como o guia deste grupo precisará ser extremamente cuidadoso, observando qualquer tipo de comportamento inadequado entre todos os passageiros – o caso de bullying que citei aqui em cima acontecia do quarto para dentro… o guia precisa de atenção redobrada.

A oferta por todos os tipos de acomodação segue normalmente, assim como a escolha dos pais que pagam pelo pacote. Mas e se houvesse uma forma de garantir mais tranquilidade ao público menor LGBTQIAPN+? Afinal, quando se trata de um grupo com cerca de 50 adolescentes, seus valores, suas crenças, sua bagagem pessoal, seus hábitos e estrutura familiar serão entregues como uma grande caixa de surpresas, quando já estiver todo mundo lá em Orlando.

Não é uma questão de oferecer produtos coloridos ou adotar # especiais no mês do orgulho. O mundo está cheio de empresas que se pintam de arco-íris e criam campanhas lindas, mas que não passam disso.

Se você PROMOVE grupos para Orlando, precisa pensar além do post no Instagram… precisa ofertar SOLUÇÕES dentro da sua operação que evitem cenários de violência, não só porque é a sua obrigação que todos sejam tratados com respeito e segurança, mas também porque a viagem dos sonhos não pode virar pesadelo.

Invista em treinar seus agentes, prepare bem seus guias, traga possibilidades que acolham a todos, ou não adianta nada adotar o discurso de que você apoia a diversidade.

Se eu estivesse operando um grupo de menores desacompanhados hoje, eu…

  • Colocaria um quarto extra no custo da minha operação, para o caso de uma redistribuição de passageiros durante a viagem
  • Colocaria no meu programa uma opção de acomodação que fosse um quarto neutro, dedicado a passageiros LGBTQIAPN+
  • Treinaria minha equipe inteira em matéria de diversidade e segurança, em especial, na identificação de situações de violência
  • Teria um canal na minha empresa dedicado a receber denúncias e uma equipe de operação apta a buscar ajuda
  • Me cercaria de diversidade na minha equipe, de forma que o meu ambiente fosse naturalmente acolhedor
  • Prepararia um KIT VIAGEM moderno e não rotularia minhas camisetas com modelos e tamanhos “femininos x masculinos”

 

Você pode começar a pensar nos pequenos detalhes: de como você escreve seus textos a como sua equipe conversa com as pessoas. Um passo de cada vez, rumo a um mundo mais colorido, mais livre e mais mágico pra todos.

Ah! Eu distribuiria gostosuras Disney coloridas no dia da reunião pré-embarque… elas não são lindas? Aliás, sabia que a Disney promove vários eventos especiais para o público LGBTQIAPN+ todos os anos? Pois é. A Disney faz, você podia fazer também, já imaginou?

Agora que eu trouxe a questão para sua reflexão, quero saber o que você pensa disso tudo.

Comenta aqui embaixo pra gente falar mais do assunto, pois quanto mais a gente trouxer questões como essa para discussão, mais a gente promove viagens que marquem o coração de nossos passageiros para sempre, de verdade. Você pode mudar a vida de alguém, pense nisso!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Compartilhar:

Você também pode se interessar por

Parece que não encontramos o que você procura.